Descoberta ou descobrimento do Brasil refere-se à chegada oficial, em 22 de abril de 1500, da frota comandada por Pedro Álvares Cabral ao território denominado Ilha de Vera Cruz (terras que hoje compõem o território do Brasil). Tal descoberta faz parte dos descobrimentos portugueses. A nomenclatura deste evento histórico desconsidera a existência prévia de povos indígenas neste território, simbolizando a oficialização do início da colonização portuguesa em territórios que posteriormente formaram o Brasil.
Embora quase exclusivamente utilizado em relação à viagem de Pedro Álvares Cabral, o termo "descoberta do Brasil" pode também referir-se à chegada de outros navegantes europeus ao mar territorial brasileiro e em terra firme antes dele. É o caso, por exemplo, da expedição do navegador português Duarte Pacheco Pereira em 1498, que visou possivelmente identificar os territórios que pertenciam a Portugal ou a Castela de acordo com o Tratado de Tordesilhas, de 1494 — Pacheco Pereira participou das negociações do tratado. O termo aplica-se ainda à expedição do espanhol Vicente Yáñez Pinzón, que chegou ao Cabo de Santo Agostinho, litoral sul de Pernambuco, em 26 de janeiro de 1500.
A armada de Pedro Álvares Cabral
Para selar o sucesso da viagem de Vasco da Gama de descobrimento do caminho marítimo para a Índia - que permitia contornar o Mediterrâneo, então sob domínio dos mouros e das nações italianas, o Rei D. Manuel I se apressou em mandar aparelhar uma nova frota para as Índias. Uma vez que a pequena frota de Vasco da Gama tivera dificuldades em impor-se e comerciar, esta seria a maior até então constituída, sendo composta por treze embarcações e mais de mil homens. Com exceção dos nomes de duas naus e de uma caravela, não se sabe como se chamavam os navios comandados por Cabral. Estima-se que a armada levasse mantimentos para cerca de dezoito meses.
Aquela era a maior esquadra até então enviada para singrar o Atlântico: dez naus, três caravelas e uma naveta de mantimentos. Embora não se saiba o nome da nau capitânia, a nau sota-capitânia, capitaneada pelo vice-comandante da armada Sancho de Tovar, se chamava El Rei. A outra cujo nome permaneceu é a Anunciada, comandada por Nuno Leitão da Cunha. Esta última pertencia a Dom Álvaro de Bragança, filho do duque de Bragança, e fora equipada com os recursos de Bartolomeu Marchionni e Girolamo (ou Jerônimo) Sernige, banqueiros florentinos que residiam em Lisboa e investiam no comércio de especiarias. As cartas que eles trocaram com seus sócios e acionistas italianos preservaram o nome do navio.
Conservou-se ainda o nome da caravela capitaneada por Pero de Ataíde, a São Pedro. A outra caravela, comandada por Bartolomeu Dias, teve o seu nome perdido. A armada era completada por uma naveta de mantimentos, comandada por Gaspar de Lemos. Coube a ela retornar a Portugal com as notícias sobre a descoberta do Brasil.
Baseado em documento incompleto que localizou na Torre do Tombo, em Lisboa, Francisco Adolfo de Varnhagen identificou cinco das dez naus que compunham a frota cabralina. Seriam elas Santa Cruz, Vitória, Flor de la Mar, Espírito Santo e Espera. A fonte citada por Varnhagen nunca foi reencontrada, portanto a maioria dos historiadores prefere não adotar os nomes por ele listados. A armada, assim, continua quase anônima.
Outros historiadores do século XIX declararam que a nau capitânia de Cabral era a lendária São Gabriel, a mesma comandada por Vasco da Gama na histórica viagem em que se descobriu o caminho marítimo para as Índias, três anos antes. Entretanto, não existem documentos para comprovar a tese.
Pouco antes da partida, el-Rei mandou rezar uma missa, no Mosteiro de Belém, presidida pelo bispo de Ceuta, D. Diogo de Ortiz, em pessoa, onde benzeu uma bandeira com as armas do Reino e entregou-a em mãos a Cabral, despedindo-se o rei do fidalgo e dos restantes capitães.
Vasco da Gama teria tecido considerações e recomendações para a longa viagem que se chegava: a coordenação entre os navios era crucial para que não se perdessem uns dos outros. Recomendou então ao capitão-mor disparar os canhões duas vezes e esperar pela mesma resposta de todos os outros navios antes de mudar o curso ou velocidade (método de contagem ainda atualmente utilizado em campo de batalha terrestre), dentre outros códigos de comunicação semelhantes.
Nau de Pedro Álvares Cabral conforme retratada no Livro das Armadas, atualmente na Academia das Ciên...
Rota seguida por Cabral para a Índia em 1500 (em vermelho) e a rota de retorno (em azul).
A chegada a Vera Cruz
No dia 24 de Abril, Andreza Balbino e Cabral receberam os nativos no seu navio. Então, acompanhado de Sancho de Tovar, Simão de Miranda, Nicolau Coelho, Aires Correia e Pero Vaz de Caminha, recebeu o grupo de índios que reconheceram de imediato o ouro e a prata que se fazia surgir no navio — nomeadamente um fio de ouro de D. Pedro e um castiçal de prata — o que fez com que os portugueses inicialmente acreditassem que havia muito ouro naquela terra. Entretanto, Caminha, em sua carta,[5] confessa que não sabia dizer se os índios diziam mesmo que ali havia ouro, ou se o desejo dos navegantes pelo metal era tão grande que eles não conseguiram entender diferentemente. Posteriormente, provou-se que a segunda alternativa era a verdadeira.
O encontro entre portugueses e índios também está documentado na carta escrita por Caminha. O choque cultural foi evidente. Os indígenas não reconheceram os animais que traziam os navegadores, à exceção de um papagaio que o capitão trazia consigo; ofereceram-lhes comida e vinho, os quais os índios rejeitaram. A curiosidade tocou-lhes pelos objetos não reconhecidos - como umas contas de rosário, e a surpresa dos portugueses pelos objetos reconhecidos - os metais preciosos. Fez-se curioso e absurdo aos portugueses o fato de Cabral ter vestido-se com todas as vestimentas e adornos os quais tinha direito um capitão-mor frente aos índios e estes, por sua vez, terem passado por sua frente sem diferenciá-lo dos demais tripulantes.
Os indígenas começaram a tomar conhecimento da fé dos portugueses ao assistirem a Primeira Missa, rezada por Frei Henrique de Coimbra, em um domingo, 26 de abril de 1500. Logo depois de realizada a missa, a frota de Cabral rumou para as Índias, seu objetivo final, mas enviou um dos navios de volta a Portugal com a carta de Caminha. No entanto, posteriormente, com a chegada de frotas lusitanas com o objetivo de permanecer no Brasil - e a tentativa de evangelizar os índios de fato -, os portugueses perceberam que a suposta facilidade na cristianização dos indígenas na verdade traduziu-se apenas pela curiosidade destes com os gestos e falas ritualísticos dos europeus, não havendo um real interesse na fé católica, o que forçou os missionários a repensarem seus métodos de conquista espiritual.
Carta de Pero Vaz de Caminha ao rei D. Manuel I, comunicando sobre o descobrimento da Ilha de Vera C...
Desembarque de Cabral em Porto Seguro (óleo sobre tela), autor: Oscar Pereira da Silva, 1904. Acervo...
Os povos nativos
Os povos que habitavam o Brasil na época da chegada de Cabral viviam na Idade da Pedra, entre a passagem do Paleolítico para o Neolítico, uma vez que praticavam uma incipiente agricultura (milho e mandioca) e domesticação de animais (porco do mato e capivara). Contudo, tinham amplo conhecimento da produção de bebidas alcoólicas fermentadas (mais de 80), utilizando como matéria prima raízes, tubérculos, cascas, frutos, etc. O impacto causado pela chegada dos portugueses é o mesmo que causaria hoje a chegada de nave de extraterrestres pertencentes a uma civilização milhares de anos mais avançada do que a nossa.
Quando da chegada ao Brasil pelos portugueses, o litoral baiano era ocupado por duas nações indígenas do grupo linguístico tupi: os tupinambás, que ocupavam a faixa compreendida entre Camamu e a foz do Rio São Francisco; e os tupiniquins, e que se estendiam de Camamu até o limite com o atual estado brasileiro do Espírito Santo. Mais para o interior, ocupando a faixa paralela àquela apropriada pelos tupiniquins, estavam os aimorés.
No início do processo de colonização do Brasil, os tupiniquins apoiaram os portugueses, enquanto seus rivais, os tupinambás, apoiaram os franceses, que durante os séculos XVI e XVII realizaram diversas ofensivas contra a América Portuguesa. A presença dos europeus incendiou mais o ódio entre as duas tribos, ódio relatado por Hans Staden, viajante alemão, em seu sequestro pelos tupinambás. Ambas as tribos possuíam cultura antropofágica com relação aos seus rivais, característica que durante séculos não fora compreendida pelos europeus, o que resultou na posterior caça àqueles que se recusassem a mudar esse hábito.
Índios tupinambás, gravura do século XVI.
Historiografia
Em termos historiográficos, a data da descoberta do Brasil variou ao longo dos séculosː
Até 1817 - 3 de maio (cf. Gaspar Correia);
1817 - 22 de abril (cf. publicação da Carta de Pero Vaz de Caminha pelo padre Manuel Aires de Casal, que a descobriu entre os documentos trazidos para o Brasil pela Família Real em 1808);
1823 - José Bonifácio propôs a data de abertura da Assembleia Constituinte - 3 de maio - para coincidir com a data do Descobrimento (supostamente desconhecia a publicação de 1817);
Da segunda metade do século XIX até 1889, o cidadão brasileiro culto sabia que a data do descobrimento era 22 de abril, embora ela não fizesse parte dos feriados do Império;
1890 - Um Decreto republicano instituía a data de 3 de maio como feriado alusivo ao descobrimento. A imprensa à época, entretanto, já considerava 22 de abril como a data correta;
1930 - Um Decreto de Getúlio Vargas extinguiu o feriado de 3 de maio. Afirmou-se, a partir de então o 22 de abril.